Com um montante total de R$ 170 bilhões de reais para reparação e a destinação de 100 bilhões de “dinheiro novo”, que deverá ser pago pelas empresas ao longo de 20 anos. O acordo foi assinado hoje (25) em cerimônia no Palácio do Planalto

Na manhã de hoje, 25 de outubro, uma cerimônia em Brasília formalizou o Acordo de Mariana, destinado a reparar os danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG). O evento reuniu o presidente da República, o vice-presidente e os ministros da Saúde, Mulheres, Igualdade Racial, Povos Indígenas, Casa Civil e Minas e Energia, além de representantes da Advocacia-Geral da União (AGU) e membros das instituições de justiça que conduziram as negociações. Também compareceram os governadores de Minas Gerais e Espírito Santo e os presidentes das empresas Vale, Samarco e Fundação Renova. O pacto destina R$ 132 bilhões para a recuperação ambiental e social, sendo que R$ 100 bilhões serão aportados por Vale e BHP Billiton ao longo de duas décadas. Os primeiros R$ 5 bilhões devem ser liberados nos próximos 30 dias.
Quase nove anos após o rompimento da barragem de Fundão, o governo federal, Samarco, Vale e BHP Billiton anunciaram um acordo final de R$ 170 bilhões. O montante busca resolver de forma definitiva o maior desastre socioambiental do país, embora persistam críticas e incertezas. O acordo inclui R$ 100 bilhões em novos aportes e substitui o atual sistema indenizatório simplificado por um Programa Indenizatório Definitivo (PID), destinado a reparações individuais, especialmente para comunidades que ainda enfrentam dificuldades para comprovar seus danos.
O processo de negociações, que durou dois anos, envolveu diretamente 13 ministérios, seis autarquias, o Ministério Público Federal, além de autoridades estaduais e municipais de Minas Gerais e Espírito Santo e dos 49 municípios afetados. O acordo prevê algumas ações que ainda permanecerão sob responsabilidade das empresas causadoras do rompimento da barragem de Fundão, incluindo a remoção de 9 milhões de metros cúbicos de rejeitos do reservatório da Usina Hidrelétrica Risoleta Neves, o reflorestamento de 54 mil hectares e a recuperação de cinco mil nascentes. Entre as metas está também a finalização dos reassentamentos de comunidades em Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo.
Principais Detalhes do Acordo
- Valor total: R$ 170 bilhões
- Novos recursos: R$ 100 bilhões a serem pagos ao longo de 20 anos
- Indenizações e obrigações específicas das empresas: R$ 32 bilhões
- Valor já gasto: R$ 38 bilhões, segundo a Fundação Renova
Distribuição dos Recursos
- Atingidos diretos: R$ 39,83 bilhões (40,44%)
- Recuperação ambiental: R$ 16,13 bilhões (16,38%)
- Projetos socioambientais: R$ 17,66 bilhões (17,96%)
- Saneamento e rodovias: R$ 15,29 bilhões (15,52%)
- Municípios: R$ 6,1 bilhões (6,19%)
Além dos valores de indenização, o acordo destina verbas para a criação de um Fundo Popular da Bacia do Rio Doce, com R$ 5,12 bilhões para uso direto das comunidades, e R$ 12 bilhões em saúde coletiva e saneamento básico nos municípios atingidos. O BNDES ficará responsável pela administração desses recursos, que também incluem um programa de transferência de renda para pescadores e agricultores. A complexidade do acordo, que envolve mais de 13 ministérios e diversas autarquias, reflete os desafios para garantir uma reparação justa e efetiva e suscita dúvidas sobre sua eficácia a longo prazo.
A Advocacia-Geral da União (AGU), liderada pelo ministro Jorge Messias, defendeu o acordo, destacando que o processo envolveu quase dois anos de negociações e audiências com representantes das comunidades. No entanto, críticos apontam que este novo pacto acoberta problemas estruturais, como a ausência de auditorias independentes e um controle efetivo sobre os R$ 38 bilhões já pagos anteriormente pelas mineradoras, cujas aplicações nunca foram devidamente evidenciadas.
Participação social
Embora o acordo tenha sido saudado pelo governo federal como uma solução ampla, representantes das comunidades atingidas questionam a falta de participação efetiva no processo de decisão, afirmando que os atingidos continuaram excluídos das negociações e que muitos danos permanecem não reconhecidos formalmente. No dia 18 de outubro, ocorreu uma reunião convocada pelo governo federal, por meio da Secretaria-Geral da Presidência da República, em que foram apresentados, de forma inédita, os termos já definidos para a repactuação que vem sendo negociada há mais de dois anos sem a participação das pessoas atingidas.
O encontro, realizado em Belo Horizonte (MG), reuniu pessoas atingidas, movimentos sociais e Assessorias Técnicas Independentes, que puderam ter maior acesso às tratativas dos termos apresentados e dialogar com os representantes da mesa de Repactuação. No entanto, o ambiente restrito e a proibição do uso de celulares levantaram preocupações sobre a transparência do processo. A reunião foi conduzida por autoridades, incluindo o ministro Jorge Messias, advogado-geral da União; Márcio Costa Macedo, ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência; Junior Fidelis, adjunto do advogado-geral da União; e Kelli Mafort, secretária executiva da Secretaria-Geral da Presidência. Durante o encontro, as autoridades esclareceram que o objetivo era prestar contas às pessoas atingidas sobre o estágio atual do novo acordo de repactuação.
Além disso, a Articulação das Câmaras Regionais, representando as Comissões Locais dos territórios da Bacia do Rio Doce e do Litoral Norte Capixaba, enviou, no dia 24 de outubro, um ofício à Secretaria da Presidência da República, à Advocacia Geral da União, e a diversos Ministérios e Instituições de Justiça, manifestando sua insatisfação com os termos do acordo. Os representantes das câmaras criticam que, apesar de já terem expressado sua discordância em reuniões anteriores, o acordo, nas condições atuais, não reflete as demandas das comunidades. Em decorrência disso, afirmam que não referendam tal acordo.
A Articulação ainda destaca a ausência de uma participação efetiva da população nas negociações e o impacto que essa repactuação pode ter na vida das famílias que, há quase nove anos, sofrem com os danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão. Repudiam também o fato de que o texto do acordo somente foi divulgado na íntegra, após sua assinatura, dificultando o acesso a informações fundamentais para as decisões locais.
O caso segue envolto em disputas judiciais e questionamentos sobre impunidade, com algumas acusações prescrevendo ainda este ano, o que reforça a frustração e a falta de confiança das comunidades atingidas. O descontentamento é ainda mais agravado pela percepção de que a complexidade do acordo, que envolve mais de 13 ministérios e diversas autarquias, pode não garantir uma reparação justa e efetiva a longo prazo.
Texto por Andressa Zumpano/CAT|ATI